A menina que lia gibis
04/11/2025 às 17h59
Cathierine Hoffmann - Jornalista
Jornalista, formada pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos. Comunicadora multimídia, assessora de imprensa e editora reponsável do Expressão Regional
Juntei algumas moedas de um real e cinquenta centavos e fui de bicicleta até um bazar perto da praça. Fiquei uns 15 minutos olhando a estante com os últimos gibis da Turma da Mônica, julgando pela capa qual a historinha que mais me interessava enquanto o dono do estabelecimento ficava me dando sugestões. Até lançou a ideia de eu tentar ler o gibi da Barbie, o que eu escutei e logo entortei o nariz, pensando, ‘e eu lá quero ler gibi da Barbie’. Continuei pensando na melhor opção. Não era fácil comprar só um. Mas eram poucas as vezes que eu comprava um gibi, na maioria das vezes pegava emprestado na biblioteca pública municipal e depois de uma semana, devolvia todos. Meu acervo era pequeno, mas valoroso. E por isso, cada vez que dava para comprar um, era um grande momento.
Escolhi então, paguei e fui em direção da minha casa. Resolvi dobrar a esquina, empurrar a bicicleta morro acima, em direção à capela, e depois descer, pegando o rumo da minha casa. O corte de caminho tinha um propósito: naquela rua tinha menos movimento de pedestres. Eu poderia guiar a bicicleta e ler o gibi ao mesmo tempo. Ideia perfeita. E foi o que fiz. Enquanto pedalava devagar, folheava o gibi com a historinha nova em folha. Acho que li duas páginas, no máximo, até o inevitável acontecer, mais um tombo cinematográfico para a minha coleção. Joelho ralado, nenhuma testemunha, porque eu conferi. Resolvi me conformar que só conseguiria ler quando chegasse em casa. Paciência.
Isso só prova a minha devoção com a Turma da Mônica. Passei toda minha infância e até minha pré-adolescência às voltas da turminha. Cebolinha, Magali, Mônica, Cascão, Marina, Franjinha, Carminha, Bidu, Chico Bento, Rosinha, Tina, Rolo, Pipa... muitos, inúmeras personagens que me ensinaram muitas coisas, sobretudo amar a leitura. Lembro claramente de momentos na escola onde as professoras me xingavam porque eu lia gibis escondido, com eles debaixo da classe enquanto elas davam aula. Ou das vezes que ia na casa de amigas minhas e entrava dentro de barracas ou ficava atrás de uma porta para ler o gibi que elas tinham em casa e eu ainda não tinha lido. Chegava a ser chata de tão viciada. Acabei levando minha irmã no vício. A primeira palavra que ela aprendeu a escrever foi FIM, de tanto ver no final de cada tirinha. Lembro de rir sozinha das peripécias do Cascão, dos planos do Cebolinha, das aventuras da Mônica e da fome da Magali.
E foi aos 13 anos que usei um ‘salário’ que recebi por ajudar minha mãe no jornal que fiz uma assinatura para receber mensalmente os gibis da Turma da Mônica. Estão comigo até hoje, guardados como relíquias. Guardados em parte, pois com felicidade que dei alguns da coleção para meu afilhado Miguel, hoje leitor assíduo da turminha. Por isso, na celebração dos 90 anos de Mauricio de Sousa neste 27 de outubro, faço destas palavras uma homenagem ao jornalista que foi inspiração para mim e tantos da minha geração e das próximas. Saber que nós brasileiros somos tão maravilhosos na construção de cultura e educação me deixa emocionada.